Venture Capital: Entre o Brilho dos Unicórnios e a Velocidade dos Sonhos
O brilho sedutor do Venture Capital esconde segredos. Será que a busca pelo próximo unicórnio vale todos os sacrifícios?
Olá leitores da Builders 2 Builders!
Sou Luiz Fernando M. de B. Gidrão >> Luiz Gidrão, fundador e CEO da Stockash, fintech líder no Brasil em financiamento de Stock Options. Ao longo de mais de 14 anos de carreira, atuei em áreas como Crédito Estruturado, M&A, Private Equity e Venture Capital, além de ter co-fundado a MB Engenharia. Hoje, com a Stockash, nossa missão é transformar a vida financeira de colaboradores e founders, permitindo que eles destravem e maximizem todo o potencial de seus Planos de Stock Options sem a necessidade de vender uma única ação. Sou formado em Administração de Empresas pela FACAMP e possuo as certificações CFA e CAIA.
Estou honrado por ter esta oportunidade de compartilhar insights com vocês na newsletter do meu amigo Brasuca (Felipe Brasileiro) e do Gabriel. Espero que aproveitem a leitura!
Venture Capital: Entre o Brilho dos Unicórnios e a Velocidade dos Sonhos
Ah, o brilho sedutor do Venture Capital! Tão glamoroso e tão desejado por empreendedores sedentos em criar o próximo unicórnio. Mas vamos dar uma olhada mais de perto e nos aprofundar nesse oceano turbulento dos investimentos em startups.
Até 2021, com os juros praticamente a zero, o mundo estava embriagado pela ideia de que, para uma empresa crescer, era preciso acelerar ao máximo, sem olhar para trás: a tese do Blitzscaling. O Venture Capital (VC), esse Midas das finanças, almeja transformar em ouro as ideias brilhantes dos empreendedores e promete rios de dinheiro a quem domar aquele mítico unicórnio. Mas a que custo?
A grande maioria desses empreendedores, desses sonhadores, desses bravos guerreiros que ousam desafiar o status quo, são lançados na arena da inovação como gladiadores, com a promessa de glória eterna. Mas, ironicamente, 70% ou 80% deles acabam se tornando mera estatística, sendo sacrificados no Coliseu da rentabilidade.
Ah, e as “walking-deads”? Essas startups que zombam da morte, mas não prosperam? Representam outros 15% a 20% e também são vítimas desse sistema. Algumas dessas empresas poderiam ter obtido sucesso – talvez não alcançando o Olimpo, com seus unicórnios – mas seriam lucrativas e cresceriam de forma sustentável e saudável, se não fossem empurradas para um crescimento insano, para satisfazer a fome insaciável de chegar à próxima rodada de investimentos. É tudo sobre dinheiro; o resto é conversa, como diria Gordon Gekko.
O empreendedor é aquele que sonha, o que teve a audácia de acreditar em uma ideia e colocá-la em execução. E enquanto os empreendedores desbravam o labirinto das inovações, muitos gestores de VC observam do topo de seus castelos, certos de que um ou talvez dois unicórnios em seu portfólio compensarão todas as outras perdas.
Ah, meu amigo, em que labirinto capitalista nos metemos? O incisivo artigo “How Venture Capitalists Are Deforming Capitalism”, de Charles Duhigg, revela algumas mazelas de uma indústria que, outrora promissora, parece ter esquecido seu norte. Daquela chama inicial da indústria de VC nos EUA pós-Segunda Guerra, o que vemos hoje é uma fogueira de vaidades, dominada por um clube “seleto” de profissionais formados pela Ivy League — e, como não poderia deixar de ser, majoritariamente masculino.
Steve Blank, a lenda viva criadora do conceito de Lean Startup, também dispara críticas, traduzidas aqui literalmente: “Vi essa indústria se tornar uma multidão faminta por dinheiro. Os VCs de hoje não estão interessados no bem público. Eles não estão interessados em nada, exceto em otimizar seus próprios lucros e seguir o rebanho, e assim desperdiçam bilhões de dólares que poderiam ter sido direcionados para inovações que realmente ajudam as pessoas”.
A indústria de VC, nos últimos anos, mostrou sinais claros de “Exuberância Irracional”, termo cunhado e popularizado por Robert Shiller. Este conceito descreve o comportamento onde os investidores, impulsionados por um otimismo sem fundamentos racionais, inflam o preço dos ativos além do seu valor intrínseco. Neste contexto, por vezes, a indústria parecia mais com um esquema Ponzi do que com uma classe legítima de investimentos, em que o foco não era gerar valor real, mas sim garantir novas rodadas de investimentos a preços muito superiores às rodadas anteriores. E como Martin Kenney, em seu artigo de 2018, bem apontou: “empresas que queimam caixa podem continuar operando e canibalizando os concorrentes por muito mais tempo do que antes.” É um baile de máscaras onde a dança é guiada pelo dinheiro, não pelo mérito.
Tenho a impressão de que alguns gestores de VC talvez não tenham assimilado plenamente a filosofia do Blitzscaling, proposta pelo brilhante Reid Hoffman. Ele sustenta que o sucesso de uma startup não está ancorado apenas no potencial da ideia inicial, mas na habilidade de escalar suas operações de forma extremamente ágil. Porém, para que essa estratégia prospere, é essencial que a startup detenha um modelo de negócios sólido, estabeleça vantagens competitivas, mantenha unit economics consistentes e, evidentemente, apresente potencial de escalabilidade a médio e longo prazo. No entanto, mesmo que nem todas as empresas exibam essas qualidades, os VCs ainda despejam doses cavalares de dinheiro, tentando forçá-las ao Blitzscaling.
Os juros baixos desde 2008, somados ao quantitative easing promovido pelos Bancos Centrais ao redor do mundo, inundaram o mercado com uma avalanche de liquidez. A indústria de VC, com a promessa de retornos elevados, se tornou o foco de muitos investidores. No entanto, com uma quantidade sem precedentes de dry powder – termo usado no mundo dos investimentos para designar capital não alocado – nas mãos dos VCs e uma pressão crescente para alocá-lo, muitos gestores encontraram na teoria do Blitzscaling a justificativa perfeita para investir somas colossais, mesmo em situações onde essa estratégia não era a mais adequada. A consequência? Essa tendência culminou no surgimento acelerado de novos unicórnios, que alcançaram esse status quase à velocidade da luz.
Muitos VCs foram elevados ao status de gênios dos investimentos, pois suas “apostas” sempre aumentavam de valor, rodada após rodada de investimento. No passado, o melhor vencia pelo suor e inovação. Agora, o troféu vai para quem tem o bolso mais profundo. Casos como o espetacular “rise and fall” do WeWork servem de alerta: um mar de dinheiro, sem direção, pode ser tão perigoso quanto um barco furado em alto mar. E é por isso, meu amigo, que precisamos ajustar as velas antes que a tempestade nos engula, se é que já não nos engoliu.
Mas, como em qualquer conto épico, a indústria de VC tem seus vilões e também heróis. Para sermos justos, porém, não podemos ignorar os triunfos e revoluções que o VC trouxe ao nosso mundo moderno. Mas apesar das críticas, há histórias de inovação sem precedentes. Como um alquimista, o VC transformou o chumbo das ideias brutas em ouro puro. Empresas que moldaram a forma como vivemos, comunicamos e fazemos negócios. O Venture Capital tem sido o combustível por trás das maiores inovações da nossa era, desde tecnologias de comunicação até avanços médicos nunca antes imaginados.
No entanto, no final, temos que nos perguntar: vale a pena? Vale a pena acelerar tanto essas empresas, sacrificando empreendedores, colaboradores e todos os stakeholders em geral, em nome de uma rentabilidade que beneficia tão poucos? Ou talvez esteja na hora de repensarmos esse modelo, de dar uma chance real aos empreendedores e de valorizar o crescimento sustentável acima de tudo? A maior crítica fica para aqueles gestores que estão do lado dos empreendedores apenas enquanto eles são “sexy”, ou melhor, aqueles que vão conseguir captar uma próxima rodada com um valuation maior. Porque, no final das contas, não é tudo apenas sobre dinheiro; é sobre sonhos, é sobre pessoas, é sobre construir um mundo melhor.
E isso, ah, meus amigos, não tem preço.
Excelente, Luiz. O Venture Capital tem seu lado positivo e negativo hoje em dia. Comecei a entender melhor essa dualidade quando comecei a ler o livro VC: An American History.